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Manguezal
Ponto 05
Próximo à foz do rio Jaguaribe, margem direita, no encontro da água doce com água salgada, se encontra a quarta maior área de mangue do Estado do Ceará com 11 hectares e 64 metros. É nesta área que está inserida a Comunidade Quilombola do Cumbe, onde desenvolve várias atividades de pesca e mariscagem, e assim garante sua segurança alimentar do mangue que a cerca.
Depoimento Ronaldo
Bom dia, me chamo Ronaldo Gonzaga da Silva, sou pescador artesanal há mais de 30 anos. Aprendi com meu pai, com meus amigos, com meus tios, a trabalhar na pesca. Aprendi mais com meu pai e meus irmãos, porque eu tenho uma família de treze irmãos e todos vêm da pesca, né.
Vou falar sobre a importância das árvores do manguezal - porque quando a gente fala de pesca, aí inclui o mangue e o rio - mas a minha maior fonte de renda é o manguezal. E a comunidade, todo tempo de resistência dela e de que ela existe, ela tira a sobrevivência do mangue. Hoje – há muitos anos que se passou, já chegou vários empreendimentos na comunidade –, mas a maior fonte de renda hoje, que ainda compara na comunidade, é a pesca – que a maioria é cata de caranguejo, que se dá na área de manguezal. E eu acho assim, é essencial para a existência da comunidade, porque a comunidade aqui resiste, há mais de 200 anos que a comunidade existe, e ela é sustentável, por causa do manguezal. Já teve vários empreendimentos que entrou na comunidade, mas é temporário, fale, não produz mais; mas o manguezal tá aí; muito, muito degradado, muito agredido, muito destruído, mas ele ainda dá sustento à população do Cumbe.
Aí, eu digo assim, enquanto existe mangue tem alimento. Antigamente meu pai não se preocupava, meu avô... Minha avó teve 27 filhos. Meu avô não se preocupava de ter filho porque tinha sustento. Meu pai teve 13 filhos, não se preocupava, porque tinha alimento. Eu tenho dois filhos – hoje eu me preocupo de ter filho, porque o mangue tá morrendo. Se o mangue tá morrendo, o sustento tá se acabando. Aí a importância essencial, para existência da comunidade, é a área de manguezal, tanto para mim como para as famílias que tá na comunidade. Porque a comunidade aqui da região do Aracati tem vários ciclos de produção industrial, e aqueles ciclos vai se acabando... mas o manguezal tá aí. Muito degradado, muito destruído, mas tá dando sustento. Qualquer pessoa que sai pro mangue hoje, ele traz o seu sustento. Se ele não tiver uma farinha, ele pega um caranguejo, vende, compra a farinha; se ele quiser comer uma carne, ele vai, pega um caranguejo, vende, compra e come uma carne; se ele não quiser comer a carne, ele tem um caranguejo, tem um peixe, tem a ostra. Essa opção de viver, quem que tem essa opção de se alimentar? Nós tem! Aí você imagina a importância de uma área dessa. E não se é dada o valor! A região, os órgãos municipais, estado, principalmente o município, não tá nem aí pra área de manguezal. Os próprios pescadores, uma grande parte, só querem usufruir, iludidos pelo capitalismo, de produção de empresa; estão deixando mangue de lado para apoiar outros empreendimentos. Isso aí eu fico muito preocupado, porque se não tiver mangue não vai ter mais sustento. A gente vai ficar submisso, escravo, aos empreendimentos.
Aí eu digo assim, a importância do manguezal para nós aqui é tudo, é a nossa vida; se tirou o mangue da gente, a gente vamos ter que migrar para outros lugares. Teve uma época que o caranguejo morreu aqui, teve gente que migrou para outros estados para poder tirar o seu sustento. Porque se eu sou daquela área, daquele trabalho,se eu só trabalho naquela área, se se acabou aqui a função para mim, eu vou vou migrar para outro lugar. Isso aí é a importância da sobrevivência, da existência das famílias na comunidade, é o manguezal.
Tipos de Mangue do Cumbe
Sobre as espécies das árvores do mangue, aqui o mais popular nós chama o sapateiro - que muita gente conhece como mangue vermelho. Ele é um mangue que a raiz dele é em cima da terra. Facilmente você já sabe qual é. Você chega num manguezal, tem local que ele predomina. É só ele. Você consegue andar quilômetros de mangue por cima da raiz dele. Tem raiz que dá dois metros do chão. Aí a gente conhece mesmo como sapateiro. O [nome] popular também, mangue vermelho, muita gente não conhece. Aí é onde é o refúgio do caranguejo, lá onde ele é muito fechado, muito aninhado as raízes, lá é onde é o refugio do caranguejo. É o mangue vermelho. Ele também é o que cresce mais alto; ele é uma das árvores que fica mais alta.
E aí nós também temos um mangue que nós chama o mangue manso. Aí conhecido como mangue preto. Mangue manso, todo mundo chama. “Eu quero um galho de mangue manso”, “Eu quero uma muda de mangue manso” - todo pescador vai saber qual é o mangue. Ele a gente chama também mangue preto, porque ele tem a casca mais escura, a folha redonda, mais pequena - porque a folha do mangue vermelho é mais grande; ela é larga e grande; e já a do mangue manso não, ela é redonda, mas ela é menor. E ele cresce também, ele cresce muito. Ele não cresce que nem o mangue vermelho, mas ele chega bem próximo. Também aqui para nós ele tem área que ele predomina. Tem área que é só mangue [manso]... Ele se dá muito bem com mangue sapateiro. Mas tem área que só predomina o mangue preto, mangue manso. Você encontra aqui e acolá uma árvore de mangue vermelho, mas predomina mais é ele. E lá nessa área também onde, na época que o caranguejo sai da raiz – porque tem uma época que o caranguejo sai da raiz para trocar a carapaça –, ele troca no limpo: é debaixo das árvores do mangue manso. Porque ela é grande, fica aquela sombra gigante. Aí tem a época que o caranguejo sai da raiz, do refúgio dele, e vai pro limpo, para debaixo das árvores do mangue manso.
E também nós temos o canoé. Aqui na nossa linguagem chama canoé. Conhecido como mangue branco. A gente vê que ele gosta de dar mais na área mais salgada, em apicum, na beira de rio – assim, beira de mangue nós chama apicum, vajado – ele fica mais nessa área. Só no Rio Grande do Norte que lá, como lá é muito salgado, tem uma área lá que predomina é o mangue branco. Porque lá é muito salgado. Aqui a gente vê mais ele no apicum, porque apicum é a área de mangue mais salgado. A parte mais salgada do mangue é o apicum, é onde a gente vê mais o mangue branco, que é o canoé. E ele acumula muito sal. Você chega numa árvore do mangue branco, você já vê um monte de sal nas folhas, no caule da árvore, aí a gente conhece como o mangue branco, o canoé.
E o mangue que tá quase extinto – muito local não tem, tem gente que nem conhece esse mangue –, nós chama de mangue ratim, que é conhecido como mangue de botão, porque ele bota uns caroços, uns botão. E ele também dá muito na área de apicum. E como essa área, assim, no meu ponto de vista, tá cada vez mais ficando salgada por causa dos empreendimentos, ele tá se acabando, tá quase extinto. Tem região que tinha muito dele e não tem mais. Esse é os quatro tipos de mangue que a gente tem aqui na nossa área de manguezal, essas quatro espécies.
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