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Pescador
Ponto 16
Aí é um tipo de pesca muito comum aqui no rio Jaguaribe, pesca de rede boieira. Como vocês estão vendo aí, tá eu e a minha companheira. Nós colocamos a rede, é um levando o barco e outro soltando a rede. Aí nesse momento nós estamos recolhendo a rede. Eu tô guiando o barco e a minha companheira tá puxando a rede. E o peixe que vem nesse tipo de pesca é a tainha. É muito comum essa pesca de tainha aqui com rede boieiro, aqui no rio Jaguaribe.
Essa imagem aí você vê um homem negro de cabelo branco, blusa vermelha. Aí ele tá jogando a tarrafa, é um tipo de pesca que a gente chama de tarrafear. Você fica na espera, na hora que o peixe tá vindo, você joga a tarrafa para cobrir o peixe. Também é uma técnica muito usada aqui no rio Jaguaribe, aqui na nossa comunidade.
Aí como vocês estão vendo, o companheiro pescador Everardo tá limpando o peixe. Nós fizemos a pescaria de rede boieira, tainheira, e ele tá na limpeza do peixe pra poder fazer o pirão e o assado. Aí nesse dia nós fomos comer no mato. Também a gente usa muito aqui o Cumê no Mato, que é uma prática da comunidade.
Aí essa imagem aí tá mostrando o pescador segurando a rede, nós chama “rede de arrasto”, nós conhece como “três maio”. Essa pescaria é feita aqui na nossa praia. A gente coloca a rede, sai numa jangadinha colocando a rede, e fica uma equipe no seco para puxar a rede. Aí a rede da malha autorizada e pega várias espécies de peixe aqui na nossa praia aqui do Cumbe.
Depoimento (Seu Tonis)
Eu sou Antônio Ferreira de Oliveira. Eu tenho 73 anos. Sou pescador, fui agricultor. Hoje eu sou pescador só pelo esporte, não pela vida de pescaria. Porque só vou pescar quando eu tô muito carente com fome para pegar a alimentação. Conheço toda a área de Aracati e o Cumbe. De Cumbe a Canoa, onde for marítimo eu conheço tudo. De pescaria eu pesquei de tudo e pesco ainda de tudo. E a coisa melhor do mundo que eu acho é ser pescador. Pescador ele vê de tudo o que é bom. Pode até ver um pouquinho do que não é bom, mas o que é bom sempre cobre a ruindade, né, e as coisas que não é de ser. Mas como a gente aqui somos pescador, veve no rio, na marisca pegando de toda a qualidade de marisco, do peixe a ostra, sururu, camarão, caranguejo. Nessa área eu sou uma pessoa que conheço de tudo. E eu tenho 40 anos, 50 anos de pescaria nessa área de rio, e costa mar. Me acho feliz ser um pescador. Não acho melhor porque uma parte de gente que tem por aqui destrói a nossa natureza, destrói o nosso lar. Acabando com nossas árvores que nós tem, que cobre nossa região, que dava mais sustância para nós sobreviver; e mesmo assim, através de muita dificuldade, nós tamos levando a vida, e continuamos pescando para se alimentar e para sobreviver. Eu pesco de tudo, do caranguejo ao peixe, a ostra, o sururu, o guaiamum. Se for preciso, eu pesco até o guaiamum! E acho bom quando eu tô na pescaria mais os meus amigos, a gente pescando para se alimentar, comer um peixezinho assado na beira do rio. É maravilhoso! Para mim eu fico maravilhoso, fico satisfeito. Eu me sinto feliz e gosto demais de estar no rio, na natureza vendo aquelas árvores balançando, os passarinhos cantando. É muito bom demais.
Eu pesco de tarrafa e pesco de tapagem, peixe pra pulo e peixe para despesca, na mão. Mas a melhor que eu acho é quando eu vou pescar, que eu estou na beira do rio esperando a maré um pouco encher… que ela tá um pouco seca, um pouco vazia; aí quando ela começa enchendo, eu já começo olhando, ver qual é os peixes que vem. O peixe é muito sabido, o peixe. O peixe é sabido igual a nós, ou inté mais do que nós. Eu esperando o peixe na beira que nem um socó, na beira do rio que nem um socó, com a tarrafa na mão, esperando o peixe vim para eu lancear, pegar o peixe, muitas vezes… muitas vezes eu dou um lance para pegar dez peixes, eu pego dois. As outras me vê e vai embora. Elas vê! Você fica detrás de qualquer pé de árvore grosso, fazendo aquela pesquisa para pegar elas, elas são sabidas demais, o peixe é natureza, a natureza é sabida. Quando eu vou jogar tarrafa, eu quando eu jogo a tarrafa… Às vezes, tem vezes que eu jogo a tarrafa, eu não pego. Porque? Porque elas já me viram e antes de eu lancear, elas não esperam. Quando a tarrafa sai da mão, elas…! Aquele susto! Às vezes eu pego e às vezes não pego. Na tapagem, que eu tapo de rede… eu tapo é umas camboa – as “gamboa”, que eles chama de “gamboa”, né –. Eu tapo uma gamboa daquela, ali não, ali é diferente. Eu faço uma tapagem de seco a seco, e tem que encambitar todinha no pé dos barranco da gamboa, de um lado e outro, tem que botar um cambito embaixo, um cambito no meio. Um cambito embaixo, um cambito no meio, encambitar todinha, porque senão ele ainda passam pela brecha onde tiver.
Eu faço, eu chego com a maré cheia. A maré cheia, eu fico fazendo hora na maré. Quando a maré tá cheia, preamar, eu passo uma rede de lado a outro, amarro ela por cima, e depois eu mergulho, amarro ela por baixo, todinha no pé da muruada, da estacada, a gente faz um pouco estacada assim que nem ser uma carreira de vara. Aí depois eu mergulho, amarro todinha por baixo, e depois eu encambito. Encambito quer dizer: você tira um galho de árvore de mangue, de qualquer árvore, né, aí faz um cambito. Aí quando eu terminar de amarrar por baixo, eu enfio o cambito todinho pelo meio. O peixe de fundo – o peixe de fundo é carapeba, o peixe de fundo é bagre, é vermelha e isso são os peixe de fundo – esse peixe de fundo se você não encambitar todinha por baixo, o peixe ele vem por cima, mas ele desce, passa por baixo e vai embora, então tem que encambitar todinha de lado a lado, seco a seco, que é para quando eles vir, ele desce para baixo, não tem espaço para ele passar. Então é mais fácil de eu pegar.
Pra nossa atividade do Cumbe, é a nossa pescaria. De qualquer modo, tanto faz como peixe, como qualquer marisco do rio, para nós, a nossa maioria – que aqui nós, nós quilombola somos a maioria. O outro pessoal que é dos criadores de camarão, a eólica que nós temos aqui, um parque, nós não temos quase ninguém trabalhando no parque da eólica. Na cultura, dessa cultura da pesca do camarão, que eles pescam, tem é minoria. Aqui para nós, a maioria é a nossa associação quilombola. Porque tem muito pescador que sobrevive da vida marisca. Tanto faz mulher, como homem. Aqui tem um pessoal que vive… eu tô lá em casa sentado, quando passa um pessoal – e ainda não vou pescar – passa um pessoal de bicicleta, ou de pés, pro rio, aí eu fico olhando, que quando der fé passam de volta com saco de sururu! Chega em casa, vai distribuir aquele sururu, para depois vender para sobreviver, é muito importante para nós aqui! A pesca para nós aqui é a maior riqueza do nosso lugar, Cumbe, é a pesca. Aliás não é só daqui não, da nossa cidade de Aracati. Você não tinha idade, mas aqui, há 30 anos, 25 anos – eu sou pescador há, de muitos anos – eu ia pescar aqui no largo do rio Jaguaribe, aqui perto da cidade Fortim, eu ia num bote, eu via três botes do Aracati, dois botes, passando por mar. Pro rio eu não via um bote pescando. Hoje, a nossa cidade Aracati, hoje tem tanto do bote pescando no rio, que você saindo do Aracati, da ponte do rio Jaguaribe aí do Aracati, até o quebrar do mar, saindo na boca da barra, você vê tanto bote que você perde até a conta de fazer conta de tanto bote, e todo mundo pesca, e todo mundo pega. É como o Cumbe, Jardim, é o Fortim. Todo mundo sobrevive da pescaria.
Aqui o homem é pescador, a mulher pesca no outro lado, pesca o marisco. E é muito bom, eu pelo menos eu apoio a todo mundo, mesmo que hoje eu tô aposentado, mas eu ainda continuo ainda na atividade da pescaria e gosto de pescar. Eu sou um cara que eu saio de casa a boca da noite, eu passo a noite todinha no rio. Mas só porque eu gosto de tá na natureza, eu fico uma hora da madrugada, eu estou lá debaixo das árvores, os pássaros cantando, aqueles pássaros que canta pela noite, e eu debaixo das árvores ali, fazendo hora para pegar o peixe. Eu me sinto a pessoa mais feliz do mundo. Aí tem pessoas que diz “rapaz, tu é doido, tu vai sair pra ir de noite pescar!” – eu vou porque eu amo, eu amo a minha profissão.
Tipos de Pesca (Ronaldo)
Cada maré tem um tipo de pescaria. Tipo assim, eu gosto mais de pescar de rede. Eu coloco uma rede e deixo ali uns minutos dentro d'água e recolho ela. Chama rede de andada. Você bota e deixa ela andar no rio. Eu gosto de trabalhar com esse tipo de pesca. Eu gosto de jogar ela na maré baixa.
Tem a pescaria de rede. Tem a pescaria de tarrafa. Tem a de linha de anzol. Tem a tapagem. Tem pescaria de mergulho, que a gente encontra um tronco de árvore que tem muito peixe, e aí cerca com uma rede e mergulha para pegar os peixes, os que fugir da nossa mão eles batem na rede. Tem esse tipo de pesca, né.
Aí isso aí é as técnicas né, tem a tapagem, que nem o Tonis falou. Tem a tapagem para dispersar, que você fecha um braço de rio na maré cheia, e na maré seca você recolhe o peixe que ficou dentro daquele braço de rio, que nós chama gamboa. Também tem a tapagem de pulo, que na maré cheia também, você coloca uma rede embaixo para pegar uma espécie de peixe, que é a tainha. Você coloca uma rede de cor dentro da água, ela vê aquela rede, ela pula; em cima tem uma rede suspensa; ela pula naquela rede de baixo e cai na de cima, na superfície, que ela fica em cima d'água, né. Aí chama tapagem para pulo. Ela só pega um um tipo de peixe, que é a tainha.
O curral de pesca é outra, é uma pescaria muito antiga, que hoje tá até se perdendo na comunidade, que é os antigos que praticavam, e hoje poucos tem. É uma armadilha que você coloca, é tipo um labirinto. O peixe entra e não consegue sair; na maré seca você vai lá e recolhe o peixe. E é muito difícil, você tem que saber colocar a posição da rede, da entrada do peixe, se você errar um centímetro – eles não mediam, eles não usavam nenhum tipo de régua, nem nada, eles mediam em braço, em palmo – se você errar ali um milímetro de posição de entrada de peixe, o peixe consegue sair. É uma coisa que eu observava todos os dias, que eu trabalhava com meu pai direto, e não aprendi. Porque você faz tipo assim um alicerce do curral. É a armação dele. A armação estando feita, eu consigo colocar o curral. Mas aquela armação que chama muruada, eu não aprendi. E poucos aqui na comunidade sabem, né, só os antigos. E essa pescaria chama de curral né, que para ter uma ideia, é um labirinto, o peixe entra não sai mais. Agora, se você não souber colocar, fazer o labirinto, o peixe vai sair todinho, né. Tem que ter uma técnica que eu não consegui aprender, não. Você pode trazer o melhor engenheiro da universidade que ele vai ter um trabalho para aprender, ele vai usar as medidas, né, que com as medidas você consegue. Os graus, a posição… Mas só assim, que nem eu vi ele medindo na braça, no palmo. Na passada. Isso aí é uma coisa que eu não consigo, não aprendi não.
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